A América Latina e a região do Caribe têm a dúbia distinção de serem algumas das regiões economicamente mais desiguais do mundo. Mas a distância econômica entre ricos e pobres é apenas parte da história. Outro termômetro é a exclusão digital.
Hoje em dia, o acesso à banda larga é um recurso essencial para o crescimento econômico e o desenvolvimento social que tem impacto direto sobre as chances de sucesso profissional dos cidadãos. Apesar do crescimento econômico saudável da América Latina e do Caribe nos últimos anos, a região ainda está atrasada em acesso à tecnologia, particularmente nas áreas rurais, mais empobrecidas.
Essa lacuna é uma das questões que estarão em debate durante a 6ª Cúpula das Américas, de 14 a 15 de abril, em Cartagena, Colômbia, quando os chefes de governo do hemisfério vão tratar de implementar políticas para ampliar o acesso e o uso eficaz de tecnologias da informação e da comunicação.
Essa tem sido uma preocupação constante, desde a 3ª Cúpula das Américas, realizada em 2001, em Quebec City, Canadá. O Instituto para a Conectividade nas Américas, criado após essa reunião, aprovou uma série de projetos sobre tecnologia da informação que tiveram bastante sucesso.
Um desses projetos, desenvolvido na Argentina e na Bolívia, teve como objetivo melhorar o monitoramento e a prevenção da doença de Chagas, enfermidade potencialmente fatal transmitida por inseto, que exige participação ativa dos técnicos de saúde, especialmente para a coleta e registro de informações. Na medida em que o registro manual de informações foi substituído por um sistema digital, os agentes de saúde foram capazes de coletar dados com mais eficiência e as informações registradas passaram a ser coordenadas por um sistema centralizado, tornando possível mapear visualmente as taxas de incidência. Isso conduziu a um diagnóstico mais rápido e eficaz em regiões de alto risco.
Em outro projeto, enfermeiros de quatro países do Caribe — Dominica, República Dominicana, Saint Kitts e Nevis, e Saint Lucia — receberam dispositivos móveis carregados com manuais clínicos e outros programas especializados. O objetivo é oferecer ao técnico de saúde informação rápida e de fácil acesso, e reduzir o tempo gasto com a papelada.
A tecnologia também pode melhorar a educação, criar empregos, fortalecer os serviços públicos e expandir a participação no processo democrático. A Organização dos Estados Americanos (OEA) tem implementado iniciativas para promover o governo eletrônico, fornecer educação a distância e dar oportunidades para que os cidadãos estejam mais bem preparados para discutir as preocupações regionais, incluindo os temas da agenda da reunião de cúpula.
A Comissão Interamericana de Telecomunicações, da OEA, serve como fórum permanente em que os governos e o setor privado podem trabalhar juntos para promover a implantação de moderna infraestrutura, tecnologia e serviços, que vão estimular o crescimento econômico e desenvolvimento social em todo o hemisfério.
Nas Américas, os governos estão investindo em infraestrutura para ampliar o acesso. No ano passado, por exemplo, o Brasil lançou um programa ambicioso para levar serviços de internet de baixo custo para 70% dos domicílios do país até 2014.
Entretanto, na maior parte da América Latina e no Caribe, os alunos em áreas urbanas são muito mais propensos a usar a internet do que os estudantes nas áreas rurais. Um relatório da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe, da ONU, constatou que quase 60% dos jovens urbanos, até 15 anos, no México, tiveram acesso a um computador em 2009, em comparação com pouco mais de 20% dos alunos nas áreas rurais.
Deve ficar claro, também, que a tecnologia por si só não é suficiente. No ano passado, o Banco Interamericano de Desenvolvimento analisou os primeiros resultados de um esforço abrangente para fornecer laptops a crianças no Peru. O estudo não encontrou evidências de que o acesso aos laptops melhorou o aprendizado, já que o esforço não incluiu nenhuma medida para integrar a tecnologia no currículo.
Em outras palavras, a tecnologia é ferramenta útil, mas é apenas um instrumento. Como o instituto de estudos americano Conselho de Assuntos Hemisféricos fez notar, “a exclusão digital não é um problema que pode ser corrigido simplesmente com mais computadores em casa, ou telefones, laptops e aparelhos de televisão em centros comunitários; a exclusão é um problema vinculado à democratização do conhecimento e permanente inovação. Dessa forma, podemos afirmar que a inclusão digital só poderá ser alcançada quando a tecnologia da informação penetrar todas as esferas da vida diária e do trabalho”.
Esses são alguns dos desafios que os líderes da região discutirão em Cartagena. Como os países podem promover o acesso não só à tecnologia, mas também ao conhecimento necessário para utilizá-la efetivamente? Como as políticas de governo poderão apoiar os esforços já em curso da sociedade civil e do setor público? Que medidas podem ser tomadas para obter resultados imediatamente?
Os governos não podem fazer tudo, mas devem isso aos cidadãos para que todos tenham boas oportunidades e uma vida com justiça. Para suplantar a brecha digital não basta fornecer computadores. Em última análise, trata-se de suplantar as desigualdades