Fibra óptica impulsiona a transformação digital

Considerados fundamentais para a implementação de 5G e IoT, investimentos em redes FTTH (Fiber to the Home) dependem de estímulos públicos para sair do papel.

O mundo está passando por um profundo processo de transformação digital. Algumas previsões dão conta de que, em 2025, haverá mais de 100 bilhões de objetos conectados e, para muitos especialistas, as redes FTTH (Fiber to the Home) serão as grandes impulsionadoras desse processo.

A necessidade de que essas redes se popularizem no Brasil foi tema da sessão temática A consolidação e ampliação do acesso por fibra no Brasil, no Painel Telebrasil, realizada nesta quarta-feira, 22/05. O conselheiro da Anatel Aníbal Diniz ressaltou que o mercado, hoje, exige espectro e fibra. “Precisamos muito de espectro para recepcionar a tecnologia 5G. A Anatel está trabalhando para resolver o problema do espectro. Aprovamos uma resolução que garante prioridade à questão, por isso esse item esta bem sintonizado”, disse.

No que diz respeito à infraestrutura de fibra, o conselheiro acredita que um passo importante será dado com a aprovação do PERT (Plano Estrutural de Redes de Telecomunicações). Segundo ele, é o plano mais importante da agência nos próximos anos, por se tratar de um documento processual que servirá de mapa para mostrar onde o Brasil tem infraestrutura de fibra e onde o governo precisará dotar recursos.

Recursos estes, aliás, que deverão ganhar impulso com a aprovação do PLC 79. “Com a aprovação do PLC 79, a Anatel terá que fazer a valoração de qual é o tamanho desse salto da migração e destinar recursos para implantação do Plano Nacional de Banda Larga”, comentou, lembrando que, dessa forma, o PERT vai orientar a aplicação de verbas para a correção das desigualdades regionais e permitir que a infraestrutura chegue aonde não há.

Segundo Diniz, cidades que não têm backhaul nem rede metropolitana devem ter prioridade absoluta. “Podemos ajudar o MCTIC a elaborar a política pública. Não se trata de uma contribuição qualquer, mas da principal contribuição que faremos para a elaboração dessa política”, acrescentou.

Esse foco foi reforçado pelo diretor do Departamento de Banda Larga do MCTIC, Artur Coimbra. Ele lembrou que municípios com backhaul de fibra óptica têm densidade de banda larga seis vezes maior do que aqueles que não têm. “Isso mostra o papel estrutural de uma rede de fibra óptica”, disse, lembrando que, quando se fala em acesso, o contexto é completamente diferente.

Segundo Coimbra, o País conta hoje com mais de 50% dos domicílios cobertos por redes baseadas em fibra, geralmente híbridas. Os efetivamente cobertos por FTTH, no entanto, representam apenas 15%. “Quando pensamos exclusivamente em FTTH, os grande impulsionadores são os provedores regionais, que hoje representam as maiores adições líquidas de banda larga fixa no Brasil”, afirmou.

Contrariando o que parecia ser consenso, Coimbra afirmou que isso não significa que o FTTH seja à prova de futuro. Ao contrário, ele acredita que a chegada do 5G pode reduzir o interesse pela fibra, que deve ter seu uso concentrado nas redes de transporte. “Nas redes de transporte, ainda não há nada no horizonte que mostre que ela será substituída”, disse.

É nesse sentido que devem caminhar os investimentos públicos em infraestrutura. Coimbra citou como exemplo os projetos Nordeste Conectado e Norte Conectado. O primeiro, fruto de um investimento de R$ 80 milhões, deve ser concluído em dois anos, conectando 41 cidades da região. Um pouco mais atrasado, o projeto Norte Conectado vai demandar investimentos entre R$ 150 milhões e R$ 200 milhões, atendendo todas as cidades entre Macapá e Santarém. “Vamos fazer provavelmente por meio de rede subfluvial. Posteriormente, a rede será ampliada para outras cidades da Amazônia”, revelou, ressaltando que os projetos de fibra devem se concentrar em projetos duradouros como estes.

Fornecedores

Enquanto a Anatel e o governo fazem planos, o mercado reitera a necessidade da concessão de incentivos para a implantação de redes FTTH. O diretor de Tecnologia da Huawei, Nicolas Driesen, lembrou que cada 10% de penetração em banda larga pode trazer crescimento de 1,3% no PIB, 2,3% em empregos e de 15 vezes em eficiência de produção. “Isso mostra os benefícios de investimentos em banda larga fixa. Nosso maior problema é que não temos fibra onde as pessoas precisam”, afirmou.

Ele também ressaltou que o acréscimo de novos consumidores tem se dado via pequenos provedores, mas lembrou que isso também denota uma certa estagnação dos grandes prestadores de serviços de telecomunicações. Para mudar esse quadro, Driesen sugeriu a adoção do compartilhamento de infraestrutura, do lado das empresas e, do lado do governo, a redução de impostos para conectar pessoas de baixa renda ou áreas rurais.

Quem também reforçou as mudanças no perfil do consumidor foi Leonardo Melo Lins, analista de informações do Cetic.br/NIC.br. Ele citou a pesquisa TIC Provedores, realizada pelo Cetic, que apontou, em 2017, um volume de 120 milhões de brasileiros utilizando a internet.

“Mudaram os padrões de consumo: houve queda de download e aumentou o uso de streaming, que hoje é mais preponderante entre usuários brasileiros. A grande maioria dos provedores (84%) é formada por pequenas e médias empresas. E hoje 78% dos provedores oferecem acesso via fibra”, afairmou. Com isso, ele acredita que o cenário para os provedores é positivo, mas é preciso melhorar a gestão da rede para entregar serviços de melhor qualidade aos clientes.

O diretor de Engenharia da Oi, André Ituassu, também citou a mudança no perfil dos clientes para justificar a necessidade de conectividade e a ampliação das redes FTTH. “O ponto principal é IoT, que traz a necessidade de conexão quase como commodity. O cliente quer qualidade de serviço. A IoT conecta tudo, mas tem que entregar qualidade”, defendeu.

Ele reforçou que esta qualidade não deve estar presente somente na ponta, mas em toda a rede. Para Ituassu, as prestadoras de serviços precisam se reinventar, ocupando um ponto acima na cadeia de valor. “Precisamos do apoio do governo para olhar isso em uma ótica diferente. Temos rede de fibra no Brasil há muito tempo, mas agora ela é mais relevante; no transporte, ela é insubstituível”, disse.

Por conta da presença da rede de fibra da Oi em mais de 2 mil municípios brasileiros, o executivo considera que não é possível falar em transformação digital no Brasil sem passar pela Oi. “Também estamos fazendo nossa transformação no acesso: em breve vamos chegar a 400 mil domicílios com redes FTTH, e temos oportunidade de crescer essa base para frente. A Oi está fazendo o seu papel.”

Quem também está pronta é a Telefonica. O diretor Institucional da companhia, Enylson Camolesi, citou como exemplo a penetração que a prestadora tem na Espanha, onde conta com mais de 98% dos municípios fibrados. “Isso permite que a transformação digital ocorra por lá em velocidade muito grande, com vários cases de smart cities”, contou.

Ele mencionou que essa expansão só foi possível por conta do estímulo dado pelo governo espanhol, o que significa que decisões de governo e de Estado podem ser diferenciais na propagação de infraestrutura. “Em um país como o Brasil, certamente a expansão passa por uma questão de política pública. É preciso uma política pública que nos permita atingir todos os municípios”, afirmou.

E não se trata apenas de políticas federais, mas também locais. Em 2018, a Vivo expandiu sua rede FTTH para 30 cidades brasileiras, enfrentando desafios específicos relacionados, por exemplo, à ocupação de postes ou à abertura de dutos. Além disso, estas cidades são geralmente aquelas de IDH mais alto. Para chegar a outras, onde a rentabilidade será menor, Camolesi defende a atuação do Estado.

“É preciso uma ação que venha de cima para baixo e que favoreça a chegada da fibra a quem está nos municípios”, sublinhou, lembrando que o setor espera a aprovação do PERT com expectativas muito positivas. “Ninguém duvida da necessidade da fibra óptica para o 5G e tudo o mais que virá, mas os agentes públicos precisam olhar para isso. Há várias iniciativas a caminho, mas elas precisam andar mais rápido para se adequar às necessidades da economia e da população”, concluiu.