A Fundação CPqD – Centro de Pesquisa e Desenvolvimento – singra, há 35 anos, as águas de margens, nem sempre, plácidas das Tecnologias de Informação e Comunicação. O CPqD, graças à sua persistência e reunindo talentos, constitui um florão brasileiro da inovação no segmento das TICs na América Latina. Confira, aqui, entrevista exclusiva com o presidente da entidade, Hélio Marcos Machado Graciosa, com sua visão objetiva sobre o centro.
A Fundação CPqD – Centro de Pesquisa e Desenvolvimento – é uma Associada TELEBRASIL.
Sobre a criação de empresas pelo CPqD, assim se expressou Hélio Graciosa: “além do Programa de Pesquisa e Desenvolvimento, vamos ao mercado e criamos empresas”. Ressaltou o presidente que a criação de empresas pelo Centro de Pesquisa e Desenvolvimento é mais uma maneira de colocar tecnologia na rua e de gerar mais riqueza para o País. O conjunto dessas empresas denomina-se o “Universo CPqD”, um nome obtido por consenso.
Girando a roda da inovação – o universo CPqD
A Padtec pertence 2/3 ao CPqD e o restante, à “ideias net”, uma companhia que investe em empresas do setor de TMT – tecnologia, mídia e telecomunicações. A Padtec foi criada em 1999 e, em 2001, sofreu um upgrade. Oito anos depois, adquiriu a empresa high-tec israelense CIVCOM, detentora de alta tecnologia em sofisticados módulos opto – eletrônicos, com compensadores de dispersão (MDCM – manageable dispersion compensator modules). Hoje, ela é líder em sistemas para comunicações ópticas da América Latina.
A Trópico, atualmente, é 60% da Promon, 30% do CPqD e 10% da Cisco. Sua principal linha de ação se volta para a NGN – Next Generation Networks ou Redes da Próxima Geração. Aqui se encaixa a convergência de redes de voz e dados, utilizando a tecnologia de VoIP – Voice over Interner Protocol. “Todas as ligações interurbanas do Brasil passam por tecnologia Trópico, com tecnologia do CPqD”, afirmou Graciosa.
Fora do País e nos EUA desde 2000, existe a “CPqD Technologies & Systems”, agora em Fort Lauderdale (Flórida) e antes em San José (Califórnia). A CPqD Technologies & Systems tem acordo com a “Midsate Consultants”, empresa de engenharia de redes para PMEs americanas, localizada na cidade de Nephi, no estado de Utah (USA) e que utiliza tecnologia de software do CPqD.
Em 2010, na África, o CPqD criou a SPAT, com sede em Luanda (Angola), em sociedade com o grupo local Vivagest. A participação do CPqD é de 40%. A SPAT
foi contratada para cadastrar a nova rede óptica, sendo construída pela MSTelecom, em Angola. O cadastro vai ser a base para a instalação do sistema CPqD de supervisão óptica.
Outra empresa do universo CPqD é a Cleartech, criada na década de 1990. A empresa é um terço do CPqD, outro terço da DBA (Database Administrator) e outro ainda da EDS (Eletronic Data System), do grupo HP (Hewlett-Packard). A Cleartech é voltada para o gerenciamento do ciclo da receita para provedores de serviços de comunicação, incluindo o encontro de contas (clearing, daí Cleartech), entre prestadoras de serviços.
A empresa “Já” – brasileiro gosta de nomes monossilábicas –, criada pelo CPqD em 2008 –, nasceu da necessidade de haver um braço industrial para a produção em pequena escala de “tecnologia de ruptura” – são as tecnologias que permitem romper o status quo – e para nichos específicos de mercado.
Para a tecnologia do sem fio, Padtec, Icatel e Trópico, hoje, estão unidos na WXBR – Wireless Broadband Solution – com produtos no mundo do wi-fi, wimax e wimesh e soluções de sistema em banda larga sem fio para operadoras, cidades digitais, mercados corporativos e verticais.
O “universo CPqD” se completa com o Instituto Atlântico, criado há 10 anos em Fortaleza (CE) com a Cobra Tecnologia e a Padtec. O instituo, hoje, conta com cerca de 200 pessoas. “É um CPqDezinho voltado para serviços tecnológicos”, explicou Graciosa. Em 2001, os incentivos da Lei de Informática (10.176/01) relativos ao IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) exigiam que um percentual do faturamento fosse aplicado nas regiões Norte, Nordeste ou Centro-Oeste.
O Instituto Atlântico de Fortaleza, com filiais em Sobral (CE) e São Paulo (SP), gerou filhotes. A Avicena (nome de filósofo persa) é uma parceria do instituto e da “Secrel International” para serviços de software. A sigla CPqI – o parceiro inglês queria CPqD – representa uma iniciativa do CPqD com a “Firm Economics” inglesa e é voltada para o mercado offshore.
Nessas parcerias, a participação do CPqD é centrada em seu capital intelectual. O centro criou, em sua sede, uma diretoria de fomento empresarial voltada para as empresas spin-off do universo CPqD.
Um CPqD sui generis e multifacetado
Comparado com outras iniciativas semelhantes no campo da inovação de TICs, o CPqD pode ser visto como um empreendimento sui generis, admitiu Hélio Graciosa, atendendo a uma provocação.
Ao ser criado, era um centro de pesquisa e desenvolvimento voltado para o Sistema Telebrás. Então, transmissão, comutação, redes, homologação – as atividades tecnológicas da época – eram desenvolvidas no CPqD. Com o passar do tempo, o centro acompanhou o desenvolvimento nessas diversas áreas.
Na época da privatização do sistema, o Ministério das Comunicações, com Sérgio Motta, contratou uma consultoria externa para modelar o “de-para” do CPqD. Isto é, onde ele estava e para onde iria. Veio a Campinas (SP) uma consultora norte-americana dos EUA (Arthur Andersen), que passou uma semana por lá, então um departamento do Sistema Telebrás. Ao final, disse a consultora, em inglês, “o CPqD não é uma companhia e sim um miniconglomerado“.
De fato, o CPqD é uma instituição multifacetada. Nos produtos de alta tecnologia como para comunicação óticas, redes de nova geração e comunicações sem fio que desenvolve com seu capital intelectual – são 1243 profissionais, mais de 80% graduados e pós-graduados –, tais produtos concorrem com os que são desenvolvidos pelas grandes indústrias do mundo.
Já na parte de software, como, por exemplo, para aplicações de faturamento (billing), os concorrentes são também multinacionais. Porém, de outra área. Finalmente, quando se fala de ensaios e certificação, os concorrentes do CPqD serão também de outros segmentos. No quadro local, indústrias com tecnologia CPqD vão concorrer com outras indústrias que vão fazer ensaios em Campinhas. Vive-se num mundo matricial e em rede.
No mundo, as iniciativas podem ser mais focadas do que no CPqD, com instituições apenas para certificação técnica ou para desenvolver equipamentos. Daí o CPqD ser sui generis.
Se o centro é multifacetado, ele compete em diversos segmentos com concorrentes múltiplos, dependendo da particular faceta – software, sistemas, produtos, certificações – considerada. Uma macrovisão do CPqD vai mostrar uma instituição multifacetada.
“Não somos, porém, nefelibatas, vivendo nas nuvens. Internamente, temos diretorias focadas em billing, sistema suporte à operação e desenvolvimento de produtos para redes convergentes”, explicou o presidente do CPqD, acrescentando, que, a partir de certo nível, “é preciso ser focado, senão nada realmente acontece”.
Conhecendo mais o CPqD
Na parte mais tecnológica do mercado, como no desenvolvimento de produto e de sistemas de software, os concorrentes são, aqui, internacionais. “O CPqD, por filosofia, não se destina a concorrer com a PME brasileira. Só quer fomentar a tecnologia brasileira em nosso mercado”, destacou Graciosa. Os sistemas desenvolvidos pelo centro são softwares pesados e produtos complexos de alta tecnologia.
Em relação a padrões tecnológicos, dá suporte à Anatel, além de participar em órgãos institucionais. Periodicamente, o CPqD avalia o quanto de sua tecnologia chega ao mercado. Já são 13 anos de medição. O calculo é baseado na comercialização de produtos, com tecnologia CPqD, e no recebimento de royalties. Ele é o maior depositante de registros de softwares e a segunda instituição de pesquisa não acadêmica que mais deposita pedidos de patentes junto ao INPI (Instituto de Nacional de Propriedade Industrial).
Segundo dados de 2010, “desde 1998, são R$ 1,3 bilhão anuais gerados, em média, pela tecnologia do CPqD”. Comparativamente, a aplicação do Funttel, em 10 anos, é da ordem de R$ 500 milhões. “O centro multiplica por mais de 30 vezes os recursos que recebe”, ressaltou o presidente do CPqD. Tecnologia, como todo país desenvolvido sabe desde a revolução industrial, paga dividendos.
Na área do pessoal especializado para o CPqD, a rotatividade é de 8%, sendo a menor na região de Campinas (SP). Porém, é considerada alta por Hélio Graciosa. Segundo observou diplomaticamente o vice-presidente do CPqD, Cláudio Viollato, “há algumas áreas que no País estão carentes de formação. Às vezes, é preciso trazer pessoal para o CPqD e incentivá-los ao mestrado e doutorado”.
O CPqD paga e reajusta seu pessoal pela remuneração de mercado. Cada empregado tem seu “mapa de carreira”, com sua perspectivas de avanço, dentro da organização. O CPqD, ao ser privatizado, tinha da ordem de 800 pessoas, com uma idade média de 41 anos, 26% do sexo feminino e com 300 pessoas com nível de pós-graduação formal. Doze anos depois, esses números passaram a 1.250 pessoas, idade média de 37 anos, 33% de mulheres e 445 com pós-graduação formal.
”Com o decorrer do tempo, o CPqD privatizado ficou mais jovem, mais sabido e mais bonito”, resumiu, com humor, Hélio Graciosa a trajetória do CPqD privatizado.
Microeletrônica e CPqD
Em relação à microeletrônica, explicou o vice-presidente Cláudio Violato que o tema oferece duas perspectivas: “a aplicação e o projeto de circuitos integrados; e a planta fabril, com processos extremamente sofisticados”
Na década de 1980, em Campinas – no Centro de Tecnologia da Informação (CTI) com chips dedicados e no CPqD com foco em optoeletrônica –, houve bastante desenvolvimento. Todavia, na década de 90, o parque empresarial-industrial do Brasil, neste setor, praticamente desapareceu e não houve um escoamento natural dessas tecnologias.
Em circuitos integrados, ocorreram iniciativas nas universidades, mas que não se concretizaram em projetos industriais. Hoje, com a criação, pela Lei 117.59/08, do Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada S.A. (Ceitec), vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, com planta no Rio Grande do Sul e com um plano muito intenso do Governo – CI Brasil –, o Brasil tenta estruturar de novo a área de projetos para circuito integrado.
Lembrou Cláudio Violato que “é preciso haver equipamentos que usem tais componentes especializados. O CPqD já foi campeão do desenvolvimento de circuitos integrados que foram utilizados em equipamentos que o centro desenvolvia. A concepção do circuito integrado, então, era casada com os equipamentos sendo desenvolvidos”, observou judiciosamente o vice-presidente.
Com a retomada no País da atividade microeletrônica, o CPqD está também voltando a esta atividade. Não esquecer que, hoje, os equipamentos são majoritariamente plataformas de hardware com software e seus sofisticados algoritmos. O CPqD tem competência e a está aumentando nessa área.
Por outro lado, os sistemas de altíssima velocidade, acima de 100 Gigabit/s, apresentam uma eletrônica especial. Pela tendência mundial, os fabricantes e desenvolvedores de tais sistemas de alta velocidade produzirem componentes para si. O CPqD está atuando no sentido de desenvover componentes de altíssima velocidade – envolvendo desafios no hedge de complexas tecnologias – para prover a equipamentos comercias.
E o efeito China preocupa? Hélio Graciosa fez um apelo à memória, num momento de conversa informal do encontro: “há cerca de 20 anos, Brasil e China estavam, mais ou menos, no mesmo patamar de desenvolvimento de TICs. Recentemente, visitei a China. Lá não há apenas um CPqD e sim 16!”. E qual a chave do sucesso? “É preciso ter persistência, persistência e mais persistência. Não se pode começar algo e abandoná-lo no meio do caminho”.
Os 35 anos do CPqD
Sobre os 35 anos do CPqD, esclareceu Hélio Graciosa que a entidade, criada em 1976, quando era do Sistema Telebrás, festejava o aniversário em 9 de novembro juntamente com o da Telebrás, originada em 1972. Ao se tornar com a privatização uma fundação, a diretoria do CPqD decidiu por bem comemorar seu aniversário tomando como referência o dia que a diretoria da Telebrás resolveu criar o CPqD.
Esta data não deve ser confundida com o dia em que o presidente Ernesto Geisel, baseado em exposição de motivos do então ministro das Comunicações Euclides Quandt de Oliveira “autorizou a criação do CPqD, na estrutura da Telebrás”, a exemplo do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento (Cenpes), criado em 1968 e integrado a Petrobras.
A proposta inicial do ministro Quandt de Oliveira era ter um CPqD autônomo, a exemplo do Centro de Pesquisa de Energia Elétrica (Cepel), criado em 1974 e ligado à Eletrobrás, cujas origens remontam a 1954.
No dia 31 de agosto de 1976, foi decidido pela diretoria da Telebrás a criação do CPqD, data em que este ano serão comemorados os 35 anos da entidade. A atual instalação do campus do CPqD se encontra num terreno adquirido para tal, em junho de 1980.
O Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Telebrás funcionou, inicialmente, num escritório no centro daquela cidade paulista, depois nas instalações da Embratel, e se expandiu para ficar em cinco lugares, antes de se instalar no atual campus. O Polis – polo de tecnologia em Campinas, onde fica o CPqD –, tem 360 mil m2 com 55 mil m2 de área construída. Fica localizado no quilômetro 118,5 da Rodovia (SP-340) Campinas – Mogi mirim.
Para celebrar os 35 anos, dentre várias atividades, haverá comemoração interna no CPqD, com entrega de medalhas para quem completou 10, 20, 25 e 30 anos de atividades no centro. Outras homenagens pelos 35 anos do CPqD estão previstas.