Políticas públicas são essenciais para as cidades digitais

Para os participantes do painel Políticas Públicas e Estratégias para as Cidades Inteligentes, conceito depende do poder público para deslanchar e exige uma mudança cultural dos gestores e dos cidadãos.

O Painel Telebrasil 2019 foi palco de debate sobre a necessidade de políticas públicas que alavanquem a implementação de cidades digitais no Brasil. Participantes do painel Políticas Públicas e Estratégias para as Cidades Inteligentes concordaram que, sem uma série de definições regulatórias, não será possível implementar o conceito.

O primeiro a tratar do assunto foi o deputado Vitor Lippi (PSDB/SP), membro da Frente Parlamentar das Cidades Inteligentes e Humanas, que lembrou que comunicações e banda larga são estratégicas para o Brasil e citou gargalos regulatórios. “O governo não ajuda a financiar o setor. A lei das antenas, por exemplo, determina uma espera de 60 dias para aprovar antenas, mas esse prazo não está sendo cumprido”, disse, lembrando que elas serão necessárias para a implementação das redes 5G.

O deputado levantou também pontos como a necessidade de aprovação da nova Lei Geral de Telecomunicações e da desoneração dos sensores, que hoje enfrentam as mesmas taxas e burocracias que um celular, o que inviabiliza projetos de Internet das Coisas (da sigla em inglês, IoT), no Brasil. “Estamos propondo uma desoneração que foi aprovada em diversas comissões; falta só a Comissão de Justiça e deve ir ao plenário até o final do ano”, revelou.

O prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan Júnior (PSDB/RS), também citou problemas regulatórios, mas afirmou que as questões relacionadas a tecnologia e infraestrutura devem ser definidas pelo governo federal. “Imagine esperar que 5.700 legislativos municipais aprovem reformas que permitam a implementação das tecnologias necessárias às cidades inteligentes”, provocou.

Marchezan Júnior lembrou que, no caso de Porto Alegre, a cidade teve que aprovar uma lei municipal “dizendo que íamos obedecer a lei federal”. Foi o que garantiu que ela saltasse das últimas posições para a 4ª posição no Ranking de Cidades Amigas da Internet, produzido pela consultoria Teleco. Entre as simplificações trazidas pela lei, estava a retirada da necessidade de que sete secretarias se manifestassem sobre a necessidade de instalação de uma antena. “Hoje, o técnico responde profissionalmente pelas informações que ele entrega na prefeitura”, afirmou.

Com isso, Porto Alegre trabalha com a expectativa de atrair mais investimentos para o município, que hoje tem quase uma centena de antenas programadas para serem instaladas, levando conectividade para vários pontos cegos da cidade.

O prefeito ainda ofereceu às empresas participantes do painel os 800 quilômetros de fibra óptica existentes na cidade. “São públicos e queremos fazer a concessão disso. Queremos tirar isso de nossa responsabilidade para fazer funcionar”, disse.

Já o presidente do Conselho do Grupo Algar e presidente da Telebrasil, Luiz Alexandre Garcia, afirmou que as iniciativas de smart cities passam, antes de tudo, por um processo de mudança cultural. “Já é possível se fazer cidades inteligentes. Há tecnologia para agendamentos eletrônicos na saúde, sinalização virtual de trânsito etc., e a iniciativa privada está disposta a investir em regime de PPP (Parceria Público-Privada)”, enfatizou.

Para Garcia, é preciso um processo de transformação cultural para que empresas e governos possam entregar mais qualidade de vida aos cidadãos. “Se formos esperar todas as demandas que temos  serem solucionadas por lei, corremos o risco de perder a oportunidade de darmos um salto de eficiência utilizando essas tecnologias.”

Odelmo Leão (PP/MG), prefeito de Uberlândia, cidade que lidera o Ranking de Serviços de Cidades Inteligentes, concordou com Garcia. “Se não houver interação público-privada, não há caminho”, disse, citando como exemplo uma PPP que sua administração está realizando para a troca de postes de iluminação, em que os tradicionais serão substituídos por outros, com lâmpadas de LED e câmeras de segurança instaladas.

Ações governamentais

Para o secretário-adjunto de Governo Digital do Ministério da Economia, Ciro Pitangueira de Avelino, iniciativas de governo digital são problemas tanto do governo quanto da iniciativa privada, cuja solução deve integrar toda a sociedade. Ele disse que o Brasil ocupa hoje a 44a posição no ranking de eGov da ONU, o que representa uma melhora em relação às edições anteriores, mas ainda é uma posição incompatível com um país que tem o 4o maior volume de usuários de internet do mundo.

Avelino revelou que o governo tem centrado suas ações em quatro grandes desafios: a implantação da identidade digital, junto com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral); a ativação de pelo menos mais mil serviços digitais nos próximos 24 meses; a unificação dos canais digitais do governo; e a criação de uma política pública de registro de empresas.

“É o que vamos entregar para a sociedade nos próximos 24 meses, juntamente com uma demanda muito grande por infraestrutura de TI na ponta, porque vamos entregar uma grande volume de serviços”, afirmou.

Sobre os serviços a serem ativados,  Ricardo Povo, diretor de Aplicações LTE Privado da Huawei, disse que a empresa defende que uma cidade inteligente primeiro precisa ser segura. “Não há no mundo nenhuma cidade inteligente que não tenha investido em segurança”, advertiu, lembrando haver um grande investimento na área de videomonitoramento.

Mas segundo ele somente as imagens não bastam. “É preciso utilizar ferramentas e algoritmos que ajudem o agente público a ter outras ferramentas de análise. O uso da tecnologia no tratamento das imagens pode transformar o videomonitoramento em uma ferramenta de prevenção. Ele é a grande porta de entrada para transformar uma cidade segura em uma grande cidade inteligente”, disse.

Voltando à necessidade de investimentos, Aníbal Diniz, conselheiro da Anatel, lembrou que é impossível discutir cidades inteligentes sem falar de conectividade, e que isso depende de um amplo esforço de diferentes atores da sociedade, como foi feito em Porto Alegre.

Diniz citou um estudo apresentado no Plano Estrutural de Redes, que avaliou a capacidade de transporte dos municípios brasileiros. “Temos 1.099 cidades que têm rede metropolitana, mas não têm transporte, e temos 2.028 cidades que nem sequer têm transporte. Precisamos construir um backbone que ligue estas cidades”, defendeu.

Ele lembrou que a Anatel vem trabalhando em um processo de compatibilização entre o que é necessidade do setor e o que é a capacidade arrecadatória do governo, principalmente no que se refere ao leilão de frequências 5G. “Daremos toda prioridade para a simplificação no que diz respeito à atribuição das frequências necessárias, porque precisamos de competitividade e isso não se consegue com excesso de burocracia.”

Ainda sobre a ação do governo, Wilson Diniz, diretor de Inclusão Digital do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), voltou a falar do projeto Cidades Inteligentes, que ele já havia apresentado em uma sessão temática anteriormente. Ele afirmou que o projeto não acaba com a iniciativa Cidades Digitais, criada em 2011 com o objetivo de construção de rede metropolitana de fibra, interligando os órgãos de administração. “O que temos pensado para os próximos editais é uma ação casada: complementar essa infraestrutura entregando também a gestão dessa rede”, explicou.

“No ano passado, definimos que o programa Cidades Inteligentes será uma continuidade do programa Cidades Digitais”, disse, lembrando que sua área vem trabalhando na implantação de cidades inteligentes sustentáveis, seguindo um modelo de maturidade desenvolvido pela UIT. “Queremos construir um mecanismo que permita ao município continuar com suas próprias pernas depois que o ministério entregar essa estrutura”, enfatizou.

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