Brasil: Classe C de Consumo – I
Reportagem: João Carlos Pinheiro da Fonseca
Todo mundo se acha classe média no Brasil. O Brasil, em 2004, tinha 181 milhões de pessoas. Sete anos depois, 193 milhões. Dez anos depois, em 2014, deveremos ser 197 milhões. Tal crescimento não é, todavia, o fato relevante. O que realmente mudou no período foi a estrutura da nossa pirâmide social. É o fenômeno conhecido como a “emergência da nova classe C”. Mudou, em pouquíssimo tempo, a distribuição da população brasileira pelas classes econômicas.
Essa matéria foi baseada na apresentação do publicitário Renato Meirelles, sócio-diretor do Instituto Data Popular, no evento “Satélites 2011”, promovido pela Converge Comunicações, ao final do ano passado, num hotel no Rio de Janeiro. Meirelles tratou da nova classe C, em termos do que ela representa como mercado e também sobre as pessoas que a constituem. Utilizou os critérios da SAE – Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, de renda per capita familiar.
Constata o site do Diário Popular: “existe uma grande distância entre o consumidor popular e o mundo corporativo”. O mesmo site prossegue com impacto: “Bem-vindo ao mundo do carnê, do consórcio, do SPC (serviço de proteção ao crédito); do metrô, do “buzão”, da lotação, do seminovo zerado; do vale-refeição; do PF (prato feito) e da marmita. Bem-vindo ao mundo do supletivo, da escola de cabeleireiro e do curso de computação; ao mundo do celular pré-pago, da esperança na megassena; do trabalho informal, da pensão do INSS, do despertador “pras 5”, da mobilidade social.
Bem-vindo aos programas da televisão popular; ao mundo da ida ao supermercado com a família, da cervejinha gelada, da macarronada com frango, do financiamento da Caixa”. Enfim, “bem-vindos ao mundo surpreendente da economia da base da pirâmide”.
No Reino da Estatística
Classe econômica avalia o poder de compra de um grupo de consumo. A classe econômica carrega consigo, é bom lembrar, valores culturais e sociais. O sonho de consumo da classe A, não será o mesmo da classe C. Todo gerente – o público na palestra de Meirelles eram executivos – não pode esquecer que, ao mudar sua composição quantitativa, a nova classe C importou valores dos novos entrantes.
Tradicionalmente, as classes econômicas eram identificadas pelas cinco primeiras letras do abecedário. Hoje, à guisa de simplificação, consideram-se apenas três classes: AB, C e DE. Trocado em miúdos: o pessoal de cima, o pessoal do meio e o e o pessoal de baixo. Ou ainda: os “bacanas”, os “iguais a todo mundo” e os que “estão na pior”. Cada um, sempre achando que tem gente em situação bem pior.
Todo mundo se acha pertencente à classe média. O fenômeno se reflete até no uso do jargão: classe “média alta (AB)”, “média, média (C)” e “média, baixa (D)”. O termo classe média é escorregadio. A classe média é um valor estatístico. O palestrante registrou que a renda média da classe média norte-americana é maior que a renda de 94% da população do planeta. A renda do brasileiro da classe média, em termos de paridade de poder de compra (PPP), é a maior de todos os BRICS.
Obviamente continuam a existir num dos extremos, os “escandalosamente ricos” (o decil ou centil superior da classe A), os “faraós”, que compõem a lista das maiores fortunas que todo o mundo gosta de consultar, com avidez. No outro extremo, há os que estão abaixo da “linha de pobreza” que as Nações Unidas define como sendo os que “(sobre)vivem” com menos de U$1,00 (R$1,80) por dia.
Um pouco de estatística sempre ajuda a entender um país. A dados de 2004, a população do Brasil se repartia assim: 9% nas classes econômicas AB; 42% na classe C; e 48 % nas classes DE. Sete anos depois, em 2011, essa situação já era: 11% nas classes AB; 54% na classe C; e 35% nas classes DE.
Conclusão: teve gente das classes DE que migrou para a famigerada classe C. E isso não é tudo. A expansão da classe C vai continuar. Para 2014, ela deverá abrigar 58% da nossa população.
A classe C se tornou a maior classe econômica – e também social — do País. Equivale a cerca de 104 milhões de pessoas. Cinco vezes mais gente que a classe mais rica AB. E bem mais que as 67 milhões da classe mais pobre DE.
Por onde anda a nova Classe C
Em primeiro lugar, vamos relembrar a demografia das regiões do País. Em 2011, o Sudeste tinha 80,3 milhões de habitantes; o Nordeste, 53 milhões; o Sul 27,3 milhões; o Norte 15,8 milhões; e o Centro-Oeste 14 milhões, num total da ordem de 190 milhões de pessoas.
Nessas regiões, a classe C ficou majoritária no Sul, com 64% (17,4 milhões de pessoas); no Sudeste, com 63% (51 milhões de pessoas); e no Centro-Oeste com 58% (8,12 milhões). E minoritária, no Norte com 47% (7,43 milhões) e no Nordeste com 39% (20,7 milhões). No Norte e no Nordeste, ao contrário das outras regiões do País, ainda prevalecem as classes mais pobres DE.
E que regiões contribuíram, com mais gente, para o crescimento da nova classe C? Na ordem: o Sudeste contribuiu com 41% dos novos entrantes; o Nordeste com 30%; o Sul com 12%; o Centro Oeste com 9%; e o Norte com 8%. Em termos relativos, onde a classe C mais cresceu? Nas regiões mais carentes. No Nordeste cresceu 50%; no Norte 35%; no Centro-Oeste 29%. A classe C cresceu, mais modestamente, no Sudeste e Sul “maravilhas”, respectivamente com 21% e 16%.
Mas há outros fenômenos interessantes. Contribuem para a classe C, as populações das áreas metropolitanas com 26%, suas periferias (urbanas não metropolitanas) com 61% e as áreas rurais com 13%. O tipo de classe C que mais cresceu (mais 36%) foi a área rural, seguida da periferia urbana (mais 28%) e da metrópole (mais 20%).
“A nova classe C cresceu portanto às custas de quem estava nas regiões carentes, rurais e nas periferias das grandes metrópoles”, observou o palestrante da Data Folha. Essa nova classe média está descobrindo novos consumos e deve movimentar (projeções de junho de 2011) da ordem de R$1,03 trilhão. Em números redondos, a nova classe C brasileira, deve gastar mais que os PIBs da Argentina, Portugal, Uruguai e Paraguai, somados.
A queda da fecundidade média da mulher brasileira, o crescimento da população economicamente ativa e o controle da inflação foram citados como fatores positivos para o País. As classes C e D são as que seguram o consumo interno no Brasil. Esse fato contribui para diminuir a dependência às crises de origem externa.
“Nenhum gerente pode ignorar o poder de consumo da nova classe C e precisará atentar para os seus valores. A comunidade reunida em volta de uma churrasqueira, na laje de uma casa, e dançando um forró também significa consumo”, disse o palestrante exibindo um vídeo. A classe C quer consumir mais entretenimento e quer ficar ligada na internet. Roberto Meirelles mostrou resultados de pesquisas de opinião efetuadas junto à emergente classe C.
(J.C.F.) (continua)