O Marco Civil da Internet deve preservar a privacidade do cidadão brasileiro
Brasília, 24 – As discussões sobre o monitoramento de informações pelo governo americano e as recentes notícias de que isso também ocorre no Reino Unido reacendem uma luz vermelha sobre as regras que estão sendo discutidas para o Brasil na proposta do Marco Civil da Internet, no Congresso Nacional, especialmente no que diz respeito à proteção da privacidade dos usuários.
Há vários anos, o setor de telecomunicações exerce a obrigação de guardar informações de conexão de voz e SMS, como data e hora, duração, o número que está ligando ou enviando a mensagem e o destinatário. Na prática, são informações que permitem identificar quando e quanto tempo o usuário ficou na ligação e para quem ele telefonou ou mandou o torpedo.
Essas informações devem ser guardadas por cinco anos e ficam à disposição da Justiça, para a eventualidade de uma investigação criminal. Nesse aspecto, é inquestionável a confiabilidade do trabalho do setor de telecomunicações, na preservação dos dados do cidadão de bem, já que a quebra do sigilo somente é feita por ordem judicial, no caso de suspeitos.
Essa confiabilidade deve ser estendida para as comunicações via internet. Hoje, os provedores de conteúdo usam as informações dos internautas para a venda de publicidade. Alguns vão além e usam até os conteúdos dos e-mails. Um grande provedor deixa claro em sua política de privacidade que a maioria dos anúncios que aparecem ao lado da caixa de e-mail “corresponde aos conteúdos da mensagem”, o que, por si só, já contraria a lei brasileira de inviolabilidade do conteúdo das comunicações.
O que está sendo proposto pelo relator do Marco Civil é que as teles fiquem impedidas de guardar os dados relativos à internet, deixando essa atribuição, que não será obrigatória, para os provedores de conteúdo. É importante ressaltar que as empresas de telecomunicações são obrigadas a guardar as informações no Brasil, diferentemente de grandes provedores de conteúdo, a maioria empresas estrangeiras, que mantêm as informações de seus usuários fora do País.
Pelo caráter comercial de seu negócio, as empresas de telecomunicações, fornecedoras da infraestrutura, obtêm receita do uso de seus serviços, e não da guarda de informações. Os provedores de conteúdo, por sua vez, como prestam um serviço gratuito, obtêm a maior parte de sua receita da venda de publicidade, usando as informações comerciais dos hábitos de seus clientes para oferecer brinquedos para quem tem crianças, capacete para quem tem moto, malas para quem viaja muito, e assim por diante.
Mais uma vez alertamos para o risco de se privilegiar um setor dominado por empresas que não investem no País, não geram empregos aqui (empresas de telecomunicações geram 500 mil empregos) e não pagam impostos no Brasil (empresas de telecomunicações pagaram R$ 60 bilhões de impostos em 2012), com regras que expõem o internauta brasileiro, criando uma vulnerabilidade e uma insegurança para os cidadãos e seus direitos.
Entendemos que os provedores de conteúdo têm que estar submetidos aos mesmos rigores impostos às prestadoras de telecomunicações. Avaliamos, por fim, que a proposta do Marco Civil da Internet não trata adequadamente das questões de privacidade envolvidas nos casos relatados dos EUA e Reino Unido, o que exige que o assunto seja profundamente discutido antes de o projeto ser levado à votação.